Uma sessão de auto-retrato apresenta alguns desafios: uns de ordem técnica, outros de ordem fotográfica. A maior revelação é a de que se trata de uma encenação, de uma recriação dos nossos próprios gestos.
Assumindo simultaneamente os papéis de fotógrafo e de fotografado, fica excluído o registo “candid camera” de algumas abordagens; estamos diante de nós mesmos numa frontalidade incontornável.
Ultrapassadas as questões técnicas, fixado o enquadramento no tripé, modelada a luz, um segundo filtro nos abranda: a constatação da nossa aparência numa amplitude que o espelho não devolve; a realização crua de que somos “isto”, de que somos “assim”. Fazemos uma avaliação estética num soslaio intermitente de aceitação, de inevitável assimilação e racionalização; olhamos até termos uma nova história sobre o que somos. Depois da surpresa, do choque, a matéria fotográfica.
Ver fotografia em nós mesmos: Na Edição fotográfica, torna-se claro que algumas expressões faciais, alguns esgares resgatados pela câmara não têm significado, ressonância emocional no fotografado. Podem tê-lo, contudo, dentro da fotografia. É possível? Pode a tradução fotográfica do que somos num momento vazio assumir vida própria, significado em si mesma, tornar-se personagem de uma outra narrativa? Ou será tudo uma questão de bom senso durante a edição, de olhar sem pretensões?
Fotografar é contar uma história do avesso – primeiro o que aparece, depois o que está dentro – procura de ecos surdos. É o auto-retrato um gesto de introspecção ou de desapego? A resposta, a Palavra apenas pode enfunar-se pelo bafo mudo da fotografia. O que do Silêncio nasce, no Silêncio se consome: Que todas as palavras se extingam numa câmara escura.